Não é mimimi, são dados: por que a “geração Z ‘não gosta’ de trabalhar”
Entre o burnout e o bombom: o fato é que os trabalhadores mais novos – a chamada geração Z – “estão dizendo ‘não’ ao mercado” e isso tem sido uma pedra no sapato do corporativismo tradicional.
As tendências no mundo corporativo mudam tanto quanto os conteúdos virais da semana. A moda era a “demissão por vingança” e as “férias silenciosas”, mas agora vivemos a nova ascensão do “career catfishing” e do “office ghost”. Independentemente dos termos ou formas utilizadas, a verdade é que a Geração Z não aceita as mesmas condições consideradas normais pelos millennials.
Conflitos geracionais não são novidade — mas agora, eles estão filmados, legendados e postados em tempo real:
- Uma empresa demitiu injustamente alguém?
- Um funcionário foi ameaçado?
- O chefe deu um bombom de presente pela meta milionária batida?
Tudo isso estará nas redes sociais em algum momento, podendo prejudicar a credibilidade do negócio.
De modo a dar um exemplo prático, peço que pense comigo – principalmente você, gestor: Maria* passa por uma situação humilhante e, sem citar a empresa, posta um vídeo desabafando em lágrimas em seu perfil pessoal. Outras dezenas de pessoas veem e ao se identificar começam a dividir suas experiências nos comentários. Com isso, gera-se uma pequena comunidade que passou por vivências semelhantes. Esse debate propaga a ideia de que não se deve aceitar tudo “só porque precisa do dinheiro”.
Responda para si: se esse conteúdo chegar ao seu colaborador, ele também terá o que dividir com a comunidade?
Dados e Crenças
Tanto o Fórum Econômico Mundial quanto a Zurich Insurance defendem que, neste ano, os nascidos entre 1997 e 2010 serão 27% da força de trabalho do mundo. Isso quer dizer que o mercado – e o Estado – terá de se adaptar se quiser manter cerca de 2.1 bilhões de pessoas ativas financeiramente.
O comportamento da Geração Z foi estudado pela Owl Labs, que revelou o fato que jovens lideram a tendência de expor insatisfações profissionais nas redes sociais: 48% afirmaram que já fizeram publicações ou comentários negativos sobre seus empregos ou empregadores online.
A pesquisa realizada pelo ecossistema Great People e Great Place to Work (GPTW), aponta que mais de 50% dos brasileiros sentem que o lado profissional impacta nocivamente outros aspectos da vida, especialmente na saúde mental, de acordo com 80% dos entrevistados. Os outros motivos destacados foram saúde física (42%), sono (37%) e relações familiares (28%).
Geração Z e o mercado de trabalho: rebeldia ou resposta?
Em entrevista ao Portal UOL, o empreendedor e fundador da “Da quebrada pro mundo”, Alexandre Ribeiro diz que “a gen Z tem uma arrogância para achar que sabe tudo, mas nós não somos bobos e não vamos engolir sapo“. Talvez seja seguro dizer que os “sapos” são as atitudes dos trabalhadores mais novos a respeito do que consideram errado.
Como “office ghosting” que surgiu após a obrigatoriedade de voltar ao presencial. Para os jovens, não há justificativa para o retorno dessa prática, especialmente considerando a problemática da “hierarquia híbrida” onde os superiores têm horários flexíveis e home office.
Importante relembrar que isso não começou recentemente, já que as empresas há tempos divulgam oportunidades falsas ou já ocupadas, além de descrições enganosas e cenários idealizados, o que, segundo recrutadores, pode ter levado ao outro fenômeno chamado “career catfishing”.
Essa expressão surgiu do termo “catfishing” que anos atrás ficou conhecido por se referir às pessoas que fingiam ser alguém diferente na internet. No mundo corporativo foi adaptada à situação em que os candidatos dão informações falsas para vaga e após serem aceitos não aparecem no primeiro dia.
Mas como tudo mudou?
“A pandemia nos forçou a pensar diferente, e com isso as ambições da sociedade atual mudaram e as novas gerações refletem novas tendências para o mercado de trabalho“, disse Milena Brentan, coach executiva, em entrevista ao Portal Exame.
Isso está relacionado diretamente à geração mais nova que foi apresentada ao home office durante o período de isolamento. David Eastman, diretor-geral da YouGov na América Latina, relaciona a situação ao fato de que essa faixa etária deseja uma boa trajetória profissional. “Apenas 43,5% dos jovens latinos de 18 a 27 anos afirmam amar o seu trabalho”, conta.
E se diversidade é uma pauta urgente, vale lembrar que 90% dos CEOs brasileiros ainda são homens brancos com mais de 50 anos. Difícil se identificar com o topo da pirâmide quando ele nunca teve sua cor, seu gênero ou sua história.
Outra questão que preocupa o corporativismo é o fato de que os líderes estão se aposentando e não há muitos jovens interessados em ocupar esses espaços, já que preferem tempo livre em vez de cargos mais altos.
O estudo realizado pela Visier indica que 91% dos trabalhadores liberais não querem ser gestores, pois acreditam que haverá aumento de estresse e/ou pressão ou por estar satisfeito com o que faz atualmente.
Caso Real
A expressão zillennials surgiu para definir quem nasceu entre 1993 e 1998. Nascida em 98, me sinto no limbo: cresci alugando filmes na locadora e ralando o joelho brincando na rua, mas também sou dependente de tecnologia e ativista sociopolítica nas redes.
Minha carreira começou num ambiente hierárquico e meritocrático, ligado às forças armadas. Aprendi a obedecer sem questionar. Por anos, segui ordens sem refletir, até que percebi o quanto isso me afetava.
Já fiz de tudo no emprego: dirigir para chefe, fazer massagens, pintar cabelo, ganhar pizza para trabalhar até meia-noite e inventar mentiras no grupo da firma. “Se não está feliz, é só sair”, diziam. Um dia, saí. E nem um tchau recebi.
Na empresa seguinte, ainda na entrevista, me alertaram sobre o comportamento tóxico da presidência. Topei mesmo assim, afinal precisava de dinheiro. Tolerei gritos, críticas sem sentido, sobrecarga, silenciamento.
Eles me assediaram e ignoraram minha denúncia. O médico recomendou meu afastamento. Depois do período prescrito, decidi me desligar. Antes mesmo de eu assinar a demissão, já haviam anunciado minha posição.
Hoje, sigo tentando me reerguer do burnout, mas o mercado está cada vez mais cruel. Mesmo sem estar 100%, sigo porque viver custa, e custa caro.
Benefícios ou prejuízo? A matemática do mercado de trabalho
A ideia de explorar esse assunto veio de uma entrevista que fiz há algumas semanas, em que a recrutadora explicou que a vaga é 100% presencial, devido a preferência pessoal do presidente, mas não tem vale-transporte, contudo no final do ano, ganham roupas de uma marca esportiva famosa. E, para finalizar os ‘benefícios’. me disse rindo: “Não pagamos vale-alimentação até porque o valor médio de refeição por aqui é 60 reais, aí não dá, né?“.
Em outra proposta recebida – imagem acima – ofereceram apenas R$638 de benefícios. Considerando o custo de vida em São Paulo, um salário de R$3.500 (líquido) é considerável. Pensemos que os gastos mensais com transporte, onde a passagem custa R$5,20 (R$228,80 /mês) e alimentação com o valor fixo de R$36 por dia (R$792 /mês) somam R$1.020,80, o que geraria um prejuízo de aproximadamente R$390 por mês.
Na imagem à esquerda, mostra um processo seletivo em que fui eliminada automaticamente por usar um computador da Apple. A empresa determina que os candidatos devem usar seus próprios equipamentos, exigindo um sistema operacional específico.
E então?
Esses são apenas alguns exemplos da vasta quantidade de oportunidades totalmente desconectadas com a realidade que são comuns hoje em dia. Com todas essas informações que trouxe neste artigo, responda à pergunta: São os jovens que não querem trabalhar ou é o sistema que se recusa a evoluir?
Talvez a Geração Z não esteja “fugindo” do trabalho — ela só cansou de aceitar o que nunca foi justo.
Por Lis Conce, jornalista e consultora em marketing digital, paulista de coração e contadora de histórias por vocação. Com experiência na construção de narrativas que conectam marcas e pessoas, transita entre a cultura corporativa, a saúde mental, os esportes e o mundo da moda — sempre guiada pela força das palavras e pelo impacto que elas podem causar.
🎧 Ouça o episódio 143 do RH Pra Você Cast:
“Inclusão 50+: Oportunidades e Desafios para o Futuro do Trabalho”
O episódio 143 do RH Pra Você Cast mergulha no tema da inclusão etária no ambiente profissional e a construção dos times intergeracionais. Com o título provocativo “Inclusão 50+, bom para o presente e para o futuro (de todos nós)”, exploramos como a coexistência de diferentes gerações pode ser uma força motriz para empresas e profissionais.
O Dilema das Gerações
- O Questionamento Pessoal: Imagine-se daqui a cinco ou dez anos. Essa reflexão, frequentemente feita em processos seletivos, não é simples. Especialmente para o público 50+, que enfrenta estereótipos e incertezas quanto ao futuro profissional.
- O Choque Geracional: Pesquisas indicam que a interação entre gerações é benéfica para todos. Contudo, como garantir que os profissionais mais experientes não sejam deixados para trás?
Mudando o Panorama
- Inclusão como Prioridade: Precisamos mudar a narrativa, pois a inclusão de profissionais 50+ não é apenas uma questão de justiça social. Inegavelmente é também estratégica para as empresas.
- Vantagens da Mescla Geracional: A diversidade etária traz criatividade, resiliência e diferentes perspectivas. Como podemos aproveitar esses benefícios?
Conversa com um Especialista
Neste episódio, tivemos a honra de entrevistar Mórris Litvak, Fundador e CEO da Maturi. Com efeito, ele compartilhou insights sobre como desenvolver mecanismos de inclusão e promover um ambiente de trabalho que valorize todas as idades.
🎧 Clique no app abaixo e ouça o episódio completo! Descubra como a inclusão 50+ é uma oportunidade para todos nós construirmos um futuro profissional mais rico e diversificado.
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