PMEs familiares e gestores não familiares
Na ocasião do 25º aniversário da AIDAF (Associação Italiana de Empresas Familiares), foi apresentado o volume “Family Business: construindo um futuro sustentável – Diálogos entre empreendedores e acadêmicos”. Paolo Morosetti da SDA Bocconi organizou este trabalho que trata de temas cruciais ligados às PMEs familiares.
O volume olha para o futuro, buscando extrair elementos concretos com base nos quais uma empresa familiar pode “primeiro construir e depois preservar a continuidade e a sustentabilidade do Sistema família-empresa”.
Tudo isso realizou-se de forma diferente e não convencional, através de uma série de perguntas que empreendedores associados à AIDAF (entre eles, Michele Bauli, Veronica Squinzi, Elena Zambon, Matteo Lunelli) fizeram a membros da academia, convidados a responder elaborando um breve ensaio, sobre cinco grandes áreas temáticas:
- Família,
- Propriedade,
- Jovens,
- Empresa e
- Sustentabilidade.
Assiim sendo, Paolo Morosetti extraiu, a nosso pedido, algumas das evidências mais significativas encontradas.
PMEs familiares = espinha dorsal da economia nacional
É sabido que as PMEs são a espinha dorsal da economia nacional, mas muitas vezes nos esquecemos de que são também empresas familiares. Ou de primeira geração, quando guiadas pelo fundador ou fundadores. Ou, então, de segunda ou posterior geração, quando a propriedade é transferida a herdeiros reunidos em uma família proprietária ou empresarial.
A estrutura da propriedade é um parâmetro a não ser subestimado para entender o funcionamento dessas realidades. De fato, a interseção entre família e empresa assume tramas únicas ao longo do tempo. Portanto, influenciam a estratégia e a organização e, por conseguinte, o sucesso da empresa.
Imagine quais diferenças poderiam surgir em uma PME se fosse controlada por um fundador, por três irmãos e irmãs ou por oito primos e primas. Posteriormente, tente pensar no que poderia acontecer se todos os familiares ou apenas uma parte quisessem trabalhar na empresa ou até mesmo dirigi-la.
A União Europeia também reconhece a importância da familiaridade da propriedade para entender quais desafios específicos isso acarreta. Em suma, um desafio recorrente, mas não menos atual, é a sucessão geracional.
Para a maioria, parece totalmente racional que os herdeiros não devam automaticamente substituir os pais no controle da empresa e na sua gestão. Consequentemente, sentido de dever, reconhecimento e afeto são sentimentos nobres, mas nada têm a ver com a lógica de negócio.
Certamente, se esta é a teoria, na prática ainda há muitas empresas onde familiares trabalham sem a preparação adequada ou são nomeados para posições de liderança mesmo quando não são aptos ou motivados.
Familismo
Como construir continuidade geracional sem cair no familismo** ou se privar da possibilidade de integrar novas competências e perspectivas na organização?
Ademais, para aqueles que se questionam sobre essas questões, sugiro refletir sobre dois princípios de boa governança, lembrando que o assunto é de interesse também para gestores não familiares.
A diferenciação de papéis e funções – a via dinástica
O princípio da diferenciação de funções afirma que, com o passar das gerações, o familiar-herdeiro pode se tornar proprietário. Entretanto, não se envolve automaticamente na governança, na liderança ou na gestão. Esses papéis, em essência, não podem ser transmitidos por via dinástica***.
Sobre a propriedade
No que diz respeito à propriedade, esta deve ser entendida mais como uma responsabilidade do que um direito.
Na primeira geração, o papel do proprietário se confunde com os outros e não se percebe a utilidade da diferenciação. Em contrapartida, nas gerações seguintes tudo muda e aplicar esse princípio é uma tábua de salvação no mar dos conflitos familiares.
Ser proprietário é um trabalho em meio período e não dá um passe para atravessar a fronteira que dá acesso aos outros papéis. Inegavelmente, no mundo das PMEs, não é desejável uma propriedade passiva em relação às vicissitudes empresariais e sem mínimas competências empresariais.
Quem for nomeado para liderar a empresa precisará de um ponto de referência na propriedade que expresse qual é a estratégia proprietária. Ou seja, as expectativas e limites dentro dos quais elaborar objetivos empresariais e planos de ação.
Papel de Governança
O papel de governança ou de conselheiro de administração é, com efeito, atribuído pelos sócios em assembléia. Para desempenhá-lo com eficácia, deve-se adquirir conhecimento e formação para participar ativamente nas reuniões do conselho das PMEs familiares.
Assim, a gestão da conformidade – cumprimento de leis, regulamentos e estatutos – se combinará com o desejo de torná-las também fóruns para direcionar a estratégia e controlar sua execução.
No que tange ao papel de liderança, o sonho de todo empreendedor é ver pelo menos um herdeiro à frente da empresa na geração seguinte. Igualmente, nas famílias mais numerosas, espera-se também que outros familiares possam ocupar cargos gerenciais de destaque.
Trata-se de um sonho lindo do ponto de vista afetivo e motivacional. Entretanto, deve ser perseguido com prudência para não prejudicar o desenvolvimento estratégico e organizacional das PMEs familiares.
Quando as escolhas de liderança e gestão não são baseadas em avaliações meritocráticas ou em racionalidades sólidas, é um sinal amarelo. Pois, em vez de perseguir objetivos econômicos, corre-se o risco de satisfazer apenas necessidades emocionais e sociais. Por exemplo:
- a preservação da identidade e imagem familiar externa,
- a manutenção da capacidade da família de exercer influência sobre a empresa e
- a vontade de criar uma dinastia familiar no comando.
A abertura ao exterior
A aplicação do princípio da abertura ao exterior reflete-se em quatro implicações-chave, a saber:
Primeiro: homem ou mulher sozinha no comando
O modelo “homem ou mulher sozinha no comando” pode ter sucesso para os fundadores e nas pequenas realidades, mas corre o risco de causar danos se aplicado nas gerações seguintes. Acima de tudo, é a equipe que faz a diferença e é o caminho para combinar produtivamente talento familiar e não familiar.
Segundo: não se deve confundir abertura com gestão profissional
Gerir profissionalmente significa passar de uma organização que depende das pessoas para uma que opera por processos que valorizam as capacidades individuais. Em outras palavras, transformando-as em competências organizacionais no quadro de um sistema de delegação.
A Gestão profissional não deve ser entendida como expulsão dos familiares da organização. Antes de mais nada, o talento familiar deve sempre ser incentivado a assumir um papel organizacional por mérito. Outrossim, também deve ser preparado para trabalhar com gestores não familiares que possam trazer competências de qualidade, novas perspectivas e estímulos culturais.
Terceiro: abertura ao exterior e estrutura do Conselho de Administração
A abertura ao exterior deve também investir na estrutura do conselho de administração. A voz de conselheiros externos respeitáveis e preferencialmente independentes tem ganhos significativos. Com efeito, contribui para tornar o funcionamento do órgão administrativo mais estratégico e apoia os processos de gestão profissional.
Quarto: a abertura deve tocar também o modelo de negócios e operacional
Se esse raciocínio é totalmente intuitivo quando se pensa nas cadeias de suprimentos e produtivas das quais uma PME é naturalmente parte. É um pouco menos intuitivo quando se precisa intensificar trocas, parcerias e confrontos com fornecedores de know-how especializado.
Como aqueles que operam no mundo das novas tecnologias, pense nos desenvolvimentos de inteligência artificial. Ou dos serviços profissionais de valor agregado, como os fornecidos por empresas de consultoria ou que lidam com desenvolvimento organizacional e recursos humanos. As PMEs abertas têm mais chances de sucesso.
Ser gerente não familiar em uma PME familiar
Ocupar um cargo de alto nível em uma PME familiar, não sendo parte da família, pode ser uma excelente oportunidade de carreira. No entanto, é necessário muito cuidado e soft skills adequadas para enfrentá-la da melhor maneira. Algumas recomendações baseadas em muitas experiências podem ser valiosas.
- Primeiro de tudo, é necessário saber construir uma relação de confiança com a propriedade, e para isso é necessário tempo, capacidade de escuta e um forte alinhamento de valores e visão. Não é apenas uma questão de competências.
Comunicação, transparência e capacidade de dar feedback sem ferir a sensibilidade das pessoas são aspectos fundamentais.
- Em segundo lugar, é necessário saber combinar tradição com mudança para evoluir a empresa sem que isso seja percebido como uma forma de crítica ao passado ou de afastamento excessivo dos valores familiares. A gestão da mudança tem características completamente específicas nas empresas familiares: mais do que revoluções, é necessário saber implementar evoluções.
- Por fim, é necessário aceitar e saber participar de um processo de sucessão geracional, sabendo que pode haver uma fase em que se é chamado a desempenhar um papel de tutor ou mentor para jovens que podem se tornar, em uma fase posterior, os novos referências na hierarquia.
**Familismo
“Familismo” não é uma palavra comum no português brasileiro e, na verdade, é um neologismo. No contexto do texto, significa a priorização excessiva dos laços familiares em detrimento de critérios meritocráticos e profissionais na gestão de empresas familiares. Embora não seja um termo amplamente utilizado, captura bem essa dinâmica específica.(explicação gerada por IA – editoria da Comunidade).
Via dinástica***
“Via dinástica” refere-se ao processo de transmissão de papéis e responsabilidades dentro da empresa de forma hereditária, de geração em geração, sem necessariamente considerar a competência ou mérito. É a passagem de funções de liderança e gestão para membros da família como um “direito de sangue”, em vez de uma escolha baseada em qualificação profissional ou capacidade de liderança. Isso pode levar a uma governança baseada apenas em laços familiares, em vez de habilidades e experiências adequadas. (explicação gerada por IA – editoria da Comunidade).
Por Paolo Morosetti, Professor Sênior de Estratégia e Empreendedorismo na SDA Bocconi School of Management. Artigo publicado originalmente em 2024 na HR ONLine da AIDP – ‘Associazione Italiana per la Direzione del Personale‘.
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O Valor de Ter Histórias para Contar
Qual é o valor de ter histórias para contar? Para Elias Awad, jornalista e autor de 38 livros, cada registro faz toda a diferença. Inegavelmente, ostenta a honra de ser o maior biógrafo brasileiro sobre empreendedorismo. Esse status faz jus a tudo o que construiu ao longo de sua trajetória.
A Importância das Histórias no RH
E já que histórias não faltam, nada melhor do que ouvir algumas delas, não é mesmo? Portanto, o RH Pra Você Cast de hoje recebe Elias Awad e promete ser fonte de grande inspiração para muitos líderes e profissionais de RH. Enfim, confira agora!
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